domingo, 18 de dezembro de 2016

HÁ ATALHOS QUE SÓ EU SEI PORQUE OS ATRAVESSEI...






Há medos que temos de enfrentar sozinhos. Há lágrimas que têm de cair. E há caminhos que só nós percorremos, que só nós compreendemos. Há lições que têm de ser aprendidas e decepções que têm de ser sentidas.

Há experiências únicas, nossas. Há sorrisos dos quais só nós sabemos o significado. Há olhares que só nós percebemos. Há abraços que nos comovem mais do que lágrimas e comportamentos que nos dão mais carinho do que mimos.

Há percursos que só nós podemos caminhar, há atalhos na nossa vida que só nós percebemos o porquê de os ter de atravessar. Porque encontramos uma desilusão a barrar o caminho, ou porque alguém nos disse, no meio da sua falsidade, que aquela direcção era a mais correcta a seguir. Há placas que eu encontrei ao longo do meu caminho que só eu li, que só eu sei.

Enquanto caminhamos, no caminho da vida, há um sem fim de pessoas na berma a comentar, a escarnecer, a apontar-nos o dedo e a rezar para que caiamos no abismo. E às vezes caímos, nessa imensidão escura e cega. Cabe-nos a nós aprender a andar na escuridão, até encontrarmos uma vela que nos guiará para a claridade, para o discernimento. Que nos mostre que afinal não estávamos numa rua sem saída. Sim. a seguir ao nevoeiro há uma ponte. Cabe-te a ti ter a coragem para a encontrar. Até já.

sábado, 10 de dezembro de 2016

FAZER O 🌍 SORRIR!


Ela acordou e despejou o cocktail de calmantes na palma da mão. Inspirou fundo e voltou a colocá-los dentro do frasco. Não, hoje ainda não. Ela saiu de casa e fechou a porta. Entrou no carro e enfrentou o trânsito. Mais uma vez. Passou por um cão magro, muito magro. Encontrou mais à frente um homem louco a gritar no meio da rua. Ela abrandou... Estava um gato a atravessar a estrada a correr. O carro de trás buzinou. Ela arrancou novamente e continuou a conduzir. Estacionou e começou a caminhar no passeio. Reparou numa mãe junto a um autocarro que ralhava com a filha (obesa) por esta se ter esquecido do lanche que deveria levar para a escola. O motorista, com um ar zangado, esperava pelo fim da discussão, impaciente. Resmungou com a menina e ela lá subiu para o autocarro, corada e com um ar triste. O autocarro arrancou e esta mulher conseguiu ver do outro lado da rua homens de fato carregando pastas, carregando o peso do trabalho, da vida. Olhou para o céu: viu um avião que acabara de partir do aeroporto. Para onde iriam? Ela gostaria tanto de estar lá dentro, lá no céu... Todos os dias àquela hora um avião levantava voo e deixava um rasto de fumo no céu azul. E todos os dias ela olhava para ele, para o avião, e tentava imaginar qual seria o seu destino. E como todos os dias, ela baixou depois a cabeça em direcção ao chão e continuou a caminhar até ao escritório. 

Quando saiu já era tarde, estava escuro. Estava tanto frio que saía vapor da sua boca quando expirava. Aconchegou-se no seu cachecol. Viu um velhinho sentado no chão. Sentiu vergonha de si própria por não ser feliz, mesmo tendo um tecto para viver. O velhinho sorriu-lhe. Continuou, não sabia o que dizer. Entrou em casa, fechou a porta. Como se a porta fechada apagasse todo o sofrimento lá fora, no mundo. A sua respiração estava ofegante, a arfar. Estava a sufocar. Era a apatia que a sufocava.




No dia seguinte acordou, saiu de casa. Parou no meio do caminho e deu um pouco de comida ao cão. Estacionou. Olhou para a menina obesa, com umas bochechas que mais pareciam dois queques gigantes. Sorriu-lhe: "Que vestido tão bonito! Quem to ofereceu?", perguntou-lhe. A menina sorriu de orelha a orelha. Viu os mesmos homens de fato lá ao longe, eram os seus colegas. Sorriu-lhes e acenou-lhes também, e pela primeira vez viu os lábios destes homens a desenharem um leve sorriso. Olhou para o céu: lá estava o avião. Para onde iriam? Quando saiu do escritório passou no restaurante da esquina. Veio até à rua e parou junto ao velhinho. Deu-lhe uma sopa, quentinha. Ele sorriu, como no dia anterior. À vinda para casa parou novamente no meio do caminho. Abriu a porta do carro e assobiou: o cão entrou, hesitante. Carregou-o ao colo do carro até casa e fechou a porta. O sofrimento dos outros tinham ficado do lado de fora. Mas do lado de dentro do seu coração. Já mudámos o mundo só por mudar o mundo de alguém. Sorriu quando mil lambidelas de agradecimento lhe lambuzaram o rosto.